Monday, July 02, 2007

Uma prova de amor em 2039

O jantar tem que estar perfeito pro aniversário dele. Ela pensava. Como ele era perfeito. Seu aniversário merecia tudo de melhor que ela pudesse fazer.

Ela estava feliz, ele sempre foi perfeito para ela, ou melhor, o mais perfeito que um ser humano pode ser. Talvez o mais perfeito que qualquer coisa em geral. Me chateio muito mais com meu lap top por exemplo. Pega vírus, tem a conexão lenta e me incomoda.

Hoje o que importava era dizer o quanto ela o amava e o quanto seria maravilhoso continuar sendo sua mulher nos aniversários dele de 40, 50, 80 anos.

Mais tarde, à mesa:

- Minha linda, hoje eu tenho que lhe contar algo.

Aquela afirmação soou carregada.

- Que foi meu amor?

Ele então disse:

- Eu menti quando disse que meus pais haviam morrido quando eu tinha um ano de idade.

- Como assim, não estou entendendo.

- Eu nunca tive pais.

- Você sempre foi órfão, sua mãe morreu durante o parto?

- Não nada disto. Eu fui criado em laboratório.

Ela dá uma risada, um pouco nervosa. Ele sempre faz piadas, mas algo está estranho no seu tom de voz.

- Pára, Amor, coisa sem graça. Que besteira.

Ele sem sorrir, força para parecer o mais calmo e sério que consegue. Sim, ele era bem brincalhão gostava de gozações mas aquele era o momento por qual esperara desde que aprendeu sobre sua criação. Ele tinha 20 anos quando entendeu como tinha sido criado. Agora estava pronto para dividir aquilo com alguém.

- Bem, vamos lá. Há muitos anos o homem tenta entender como a vida surgiu. Desde 1953 uma experiência chamada Urey-Miller simula as condições da terra há bilhares de anos atrás aplicada a elementos básicos e tenta fazer com que um microorganismo vivo surja de elementos inorgânicos. Átomos de carbono, hidrogênio, oxigênio e o nitrogênio são sujeitos a diferentes condições de temperatura, pressão e corrente elétrica. Mas nunca tinha sido possível criar nada vivo.

- Isto até 2009, a trinta anos atrás. Pela primeira vez criou-se uma célula viva em laboratório partindo daqueles elementos. Esta célula foi chamada Pó Zero e tinha todas as funções de uma célula normal. Era como qualquer célula controlada por genes de proteínas. Era como qualquer outra célula que agora me compõe.

- A tecnologia para se clonar uma célula viva há anos existia, então depois de criada, a Pó Zero foi facilmente clonada para servir de zigoto. Implantada num útero, a natureza seguiu seu rumo, e bem, eu estou aqui.

- Então eu não entendo. Qual a diferença entre você e eu?

- Nenhuma. Com exceção que você sempre foi matéria viva, mesmo com seus genes divididos entre seus pais, você sempre foi matéria viva.

- Quer dizer, se voltarmos no tempo partindo dos seus pais, passando por seus avós, bisavós, por dezenas de milhares de gerações, até chegarmos às primeiras espécies de quase-humanos, voltarmos mais alguns bilhões de anos até os primeiros seres unicelulares, em algum momento você como eu não era orgânica.

- Agora sim linda, eu posso fazer uma piadinha: Na verdade a diferença é que eu sou mais ou menos 4 bilhões de anos mais novo que você.

Ela ri, ele sorri. Ele estava feliz. Queria dividir isto com ela. Amava ela e queria sim passar o resto da sua vida ao lado dela, até o dia que voltaria a ser inorgânico.

2 comments:

Anonymous said...

Só digo, "Bradbury" e "Asimov" que se cuidem!

Anonymous said...

Muito bem colocado os termos e as teorias de origem da vida, porém, apesar de ter se criado um organimo dito vivo em 2009, seus planos de virar substancia inorganica junto com sua amada, poderão ir por agua abaixo, pois ainda não é uma lei e sim uma teoria a "atamosfera primitiva".
E por exemplo, não que eu apoie essa teoria, for provada a panspermia?/
Convenhamos a idéia de espermatozoides cósmicos atravessando o universo e fecundando a terra como um imensso óvulo e bem mais legal para se fazer um filme.
Brincadeiras a parte Augusto , adorei mesmo o texto , tem bastante fundamento biológicoe evolucionista.
Abraços
Cesar