Thursday, July 26, 2007

Taxiodermia

Taxiodermia:
(cs) sf (táxio+dermo+ia1) Arte que consiste em dissecar os animais mortos, para os conservar com aparência de vivos. Var: taxidermia.


- O quê que está acontecendo aqui? Que pouca-vergonha é esta?

Seu Joaquim, enfurecido, olhava para sua filha de 14 anos com aquele moleque que na semana anterior foi apresentado como um colega de escola que tinha vindo estudar matemática com ela. Os dois estavam nus na cama dela agora se cobrindo com o lençol.

Adriana nervosa como nunca esteve só conseguia chorar e dizer:

- Calma pai, calma pai.

- Calma coisíssima nenhuma. E tu muleque, como é que é teu nome mesmo, Maurício, né. Vem cá que a gente vai conversar.

Os dois deixam o quarto e Adriana chorando. Maurício tremendo e ainda abotoando os jeans. Os dois descem as escadas para a sala de estar.

- Senta aí. Ele empurra o moleque para uma poltrona ao lado de uma estante onde guardava seus pássaros empalhados.

-Seu...Seu Joaquim...

-Tu cala essa tua boca, não quero ouvir nem um pio seu muleque safado!

Maurício se encolheu de pavor como nunca havia sentido.

- Você tá vendo estes pássaros aí?! Vou fazer a mesma coisa com você muleque filho duma puta.

Sete anos se passaram.

Aquele dia teria sido como foram todos os dias dos últimos sete anos. Adriana era uma fantasma presa numa casa onde Joaquim passava o dia sentado em sua escrivaninha empalhando pássaros sem abrir a boca. Para Joaquim, ele não tinha filha.

Na época do desaparecimento do Maurício a escola toda imaginou o que teria acontecido pois Adriana também não voltou mais pra escola. Pensavam eles, os dois teriam mudado de escola por vergonha.

Mas Adriana logo não se preocuparia com mais nada disto. Teve bastante tempo para aprender com os livros do pai. E hoje ela faria questão de colocar seu amado Maurício na escrivaninha de seu pai e colocar seu pai na garagem onde Maurício tinha estado todos estes anos. Tudo estaria no lugar certo.

1 comment:

Anonymous said...

Belo conto! Uma ótima mistura do melhor estilo "Poeano" (de Edgar Alan Poe, mestre americano do conto de horror), com Nelson Rodrigues, dramaturgo, escritor, jornalista e contista brasileiro, especializado em contos "de costumes" onde o bizzarro e o insólito eram temperos contumazes.